A francesa Delphine Fabbri Lawsan deixou a casa de seus pais, Glenobre da França, e foi para Paris aos 15 anos. De lá, ganhou o mundo, Europa, América do Sul e Central e Ásia, se engajando em várias causas populares e políticas, tais como a manifestação na Itália pró-Cuba, a guerra no Paquistão, a guerra em Israel e tantos outros movimentos até chegar ao Brasil.

Aos 17 anos, ainda morando em Paris, Delphine era uma fotografa iniciante e conhece dois antropólogos que a convidam para vir para a Amazônia. Assim começa sua saga no Brasil, com os povos indígenas e favelas, em quase duas décadas.  Ao chegar no Acre, numa tribo,  confessa ter tido “ um choque de realidade”,  mesmo já tendo passado por outras “experiências dramáticas”  e admite que “ Jamais imaginava o que iria encontrar. Comecei a dialogar com o deserto”, ressalta.

Após três meses, fotografando os costumes e o dia a dia da tribo, retornou à França, onde passou a viver um ir e vir nas tribos brasileiras. Neste percurso, foi investindo em sua formação: de fotógrafa à artista; de artista à curadora; de curadora à pesquisadora; de pesquisadora à cientista em Cognição e Ciências Políticas.

E ela sempre se perguntava: como ajudar os povos das florestas como artista e pesquisadora? Como denunciar  e resistir aos exterminadores dos índios e os que a ameaçavam? Delphine conta que dentre outras barbaridades, foi testemunha do assassinato de um cacique.

Na Europa, principalmente na França, seus trabalhos, suas pesquisas e seu olhar sobre esta realidade no Brasil, passaram a ser temas de exposições e mostras. “Unir a arte como uma forma jornalística de denunciar crimes e ameaças a um povo que cuida da terra, que clama por justiça, afirma. Construiu um acervo de trabalho no Brasil e vários países: “Campanha para o Prêmio Nobel da Paz para o cacique Raoni, com a fundação Darci Ribeiro; denúncia contra Bolsonaro em nome dos povos indígenas no Tribunal de Haia, em Paris; Coleção |Internacional de Projetos Inclusivos, em Taiwan; Festival de arte urbana conectada, em Cuba; Acompanhamento do Comitê de lideranças indígenas na Europa; Acampamento da Terra Livre, em Brasileira; apresentação da obra de D. Fabbri Lawson  à convirte da Unesco no Camboja

Delphine conta que  viajou por muitos cantos do Brasil: Espírito Santo,  Bahia, Belém, Belo Horizonte, Mato Grosso, Amazônia, Rio de Janeiro. “Essas idas e vindas às tribos me motivava. Havia uma conexão com a natureza. O povo indígena e a floresta me conectam, há uma energia que me impulsiona”, ressalta.

Delphine explica que, mesmo sendo rotulada de ativista pelas causas indígenas, nunca abandonou o processo contínuo de criação, e que com  pequenos passos buscava entender e revelar a invisibilidade e a violência à cultura indígena. “Sempre dei um jeito  de levar esta denúncia para o mundo”, ressalta.

Sua luta foi paralisada quando sofreu um acidente de carro em Paris, ficou quase paralítica, e teve que ficar numa cadeira de rodas durante 4 anos. Ao retomar às suas atividades, voltou ao Brasil, fez vários documentários, inclusive com o Cacique Raoni; passou por Paraty, Maricá, Angra dos Reis, São Paulo, sempre documentando e levando as denúncias para os países europeus.  Após uma entrevista  numa TV francesa, recebeu várias ameaças na França e no Brasil, afinal, “lá na França, também temos brasileiros fascistas”, afirma.

Em 2019, numa ida à Mato Grosso, foi tocaiada e recebeu dois tiros, ao som de gritos: “Em  nome de Bolsonaro!”. Foi resgatada por um homem do campo, num caminhão de boi, e levada ao hospital onde conseguiu ser salva. Depois, retornou para a favela do Borel onde morava na época. No Borel, continuou sofrendo diversos ataques por ligações telefônicas.

Um dos últimos trabalhos  foi a organização da Primeira Marcha de Mulheres Indígenas, em Brasília, em 2019,  onde conheceu Suzana Paraí, da Aldeia indigena Mata Verde Bonita, em São José,   Maricá. Nas suas idas e vindas a Maricá, acabou se apaixonando pelo pajé da tribo.

“Na minha vida, é a primeira vez que me envolvo pessoalmente com um índio, o que fez meu comportamento mudar. Sempre fui muito independente como artista, curadora  e, agora, tenho que dividir estas atividades com outras funções de esposa do Pajé”, diz.

Atualmente estamos construindo as Ocas de Vivências , que são espaços de criação e o Museu do Índio. No entanto, afirma, “atualmente, em Itaipuaçú, estamos diante de questões a serem resolvidas graves tais como a construção de um grande resort na proximidade das terras indígenas. Temos que conseguir do governo a garantia de preservação da terra, sem invasões, por não termos ainda a demarcação oficial da Funai. No local onde vive nossa tribo, não existe água potável, somos atendidos por carros pipas. Com a construção do resort, haverá um sistema próprio para  atender ao empreendimento com água potável,  mas não podemos correr o risco de sermos área de despejo e contaminação da água. Temos que garantir a depuração da água a ser realizada por este empreendimento, é o  mínimo que esperamos dele.

Segundo Delphine, a comunidade indígena ocupa a área de Itaipuaçú desde 2013, localizada na restinga de São José de Imbassaí, na qual moram 200 índios. O que será destas famílias indígenas se não houver um acordo para que, no mínimo, tenha água potável para todos?, revela,  preocupada.